terça-feira, 28 de junho de 2011

ENTREVISTA FERNANDA PETIT


1 - Como foi o processo/trajetória até tu te tornares uma atriz?
O teatro entrou no peito e na vida desde pequena. Tive a sorte de ter pais e irmãos que me levavam para ver inúmeras peças na metade dos anos 80, meus olhos ficavam maravilhados e eu me empolgava com cada peça infantil que podia assistir,cada domingo era uma delícia.Ali conheci uma atriz e aos 7 anos iniciei minha primeira Oficina com Sirlei(eu não lembro sobrenome dela).Estreando no teatro Museu do Trabalho aos  7 anos .Fiquei ali experimentando coisas e me divertindo até os 9 anos e depois dando prioridade à escola e ao ballet . Voltei a fazer teatro aos 17 anos no colégio, quando um “anjo” Lya Luft me viu no palco durante uma feira do livro e disse:”Menina vá brilhar,pois você tem uma estrela dentro de você” ai resolvi ir atrás do teatro e não larguei mais a tal estrela que eu teimo em achar o brilho.   
2 - Como foi a tua formação teatral?
Quando era mais nova eu era extremamente cara de pau. Fui na “sede” do UTA pedir trabalho e de como queria fazer teatro (óbvio que não fui aceita rsrsr). Comecei a ser rata de oficina e fazia o que tinha pela frente. Iniciei o teatro com Renato Campão, fiz oficinas com Tati Cardoso, Zé da Terreira, Luis Henrique Palese (o responsável pela minha eterna paixão pelo Stravaganza), Patrícia Unyl e Biño Sauitzvy  (descentralização da cultura ,um dos projetos mais lindos que fiz parte e duas pessoas aos quais guardo os melhores conselhos),cursos no Lume(onde descobri meus mestres,pais,teatro que acredito e conheci a cidade mais calma do mundo rsrsrs),cursos no teatro Nilton Filho(onde fui acolhida e cheguei a trabalhar no teatro como “faxineira”,secretária e assim vai,lá descobri o verdadeiro respeito por um teatro e seu espaço)...Minha formação mais forte foi os 2 anos e meio e intensos na Terreira da Tribo.Fiz escola de formação e escola de teatro de rua.Lá tive meus maiores desafios,embaralhamentos,choros,entregas ,buscas e se eu sou algo no palco eu agradeço a eles:Tânia,Paulo,Clélio e todos colegas.    
3 - Dois trabalhos teus me marcaram: “Lorcabodas” e “Solos Trágicos” pela força e vitalidade que tua presença emanava em cena.  Como é o teu processo de trabalho?
Primeiramente fico feliz por ter visto Lorcabodas. Com certeza um dos trabalhos mais fortes que eu tive. Eu chego a sonhar com o processo da peça e os cheiros, gritos, a cor vermelha e o flamenco me perseguem em sonhos (um trabalho que eu gostaria de ter continuado). Meu processo?Fico me achando uma atriz diferente em cada caminho. Me mudo,me reviro,me renovo.Me acostumei com processos sofridos,de entregas loucas,de pirar no corpo,de tentar me acostumar com a palavra.Eu gosto de músicas durante processos,de trabalho corporal intenso,de conhecer novos colegas e renovar raízes com os quais já trabalhei. Eu só penso em ser verdadeira tanto no processo, como depois no palco. Uma vez um amigo meu me disse: Petit é assim (começa o processo da peça-“eba que legal”,durante processo –“ai acho que to péssima ,por que me escolheram?”, mais adiante no processo “ hum tô me encontrando”, durante o processo ,após um xingão ou conselho –“ta agora foi!” e fim do processo “estamos juntos “ e durante temporada “eu não quero que isso acabe ou eu poderia fazer isso a vida toda”.Eu sou inconstante,sensível,crio,tento ser uma boa colega,tento ser humilde e escuto,tenho um ego enorme para críticas ,mas as ouço e deixo tentar chegar ao coração,tenho enormes crises,enormes vontades de dançar ,de ser diferente em algum aspecto,me apaixono pelo que faço,deixo o  personagem me modificar de alguma maneira na vida pra melhor...meu processo é eu e a busca.Meu processo sou eu dançando numa rua vazia de camisola na chuva.
    
4 - O que tu tens assistido e que tem te provocado e o que tu tens abominado nas artes cênicas?
Gostaria de assistir mais teatro, mas sempre estou em cartaz ou ensaiando e passo a perna nos colegas prometendo que vou assisti-los. Gosto de sair do teatro inquieta,com vontade de entrar no palco onde aquele ator estava e dizer(“eu também quero fazer parte desta peça).Quero sair pensante,envolvida,rindo,chorando,tocada...   Dos últimos trabalhos que assisti , curto e indico são (Dentro e fora,Rebú,Não sobre o amor,Andy e Edie,Parasitas,Navalha na Carne,Wonderland e o que M.Jackson viu por lá,Hotel Fuck,O Amargo santo da purificação,Comédia dos erros).Durante o Porto Alegre em cena chego no êxtase ,pois acho muito legal vários tipos de linguagens,a cidade indo ao teatro e debatendo,peças de diretores importantes.Gosto muito do trabalho do grupo ESPANCA (MG),Nando Messias em Sissy,enlouquecida pela Sutil Cia e Felipe Hirsch, grupo Armazém, grupo Galpão, Cia dos atores,Pina Bausch(minha sempre inspiração),Constanza Macras e seu maravilhoso Big in  Bombay,o Lume e seu poético Shi zen 7 cuias e Café com queijo, a efemeridade de  Ariane Mnouchkine  em  Les Éphémères ,Endstation Amerika do maravilhoso  Frank Castorf  ...
Quem sou eu para dizer abomino no teatro. Acho muito chato ver a “classe”  ou  atores jovens  indo nas minhas peças ou de outros colegas com a cara amarrada, se protegendo,fechados e minados já de críticas.
Eu vou para tentar achar algo positivo, de coração aberto, penso no esforço daquelas pessoas. Então eu não gosto de teatro que não tem verdade, que atores despejam algo sem verdade nenhuma, que me enganam, que usam coisas do populacho para serem engraçados ou para aproximar com o público, atores sem vontade no palco com o tal de “não élan”, atrizes e atores preocupados em serem mitos e lindos em cena, descaso..isso sim eu abomino.
5 - Teu trabalho é reconhecido, através do público, criticas e prêmios. Duas questões: Como você vê o papel da crítica e como você recebe as premiações, se puder divida conosco os prêmios já recebidos por ti, e como estes prêmios redimensionam a tua carreira? Sabe que estou tendo meus primeiros contatos com a critica. Há poucos críticos em Porto Alegre e os poucos que viram meus trabalhos falaram bem. Mas eu me apego aos trabalhos, defendo e nem sempre é legal ler que não curtiram sua peça. A peça não sou eu, são todos juntos.
Sobre prêmios tive a sorte de ganhar 3 prêmios durante meus 10 anos de teatro.Minha primeira indicação foi como atriz infantil na peça O MACACO E A VELHA (direção de Deborah Finnochiaro). Depois ganho em 2007 meu primeiro Tibicuera pela peça A GATA BORRALHEIRA (direção: Tiago Mello) e no ano de 2010(o ano que considero de maior entrega e dificuldade financeira) recebo prêmio Brasken de melhor atriz por Solos Trágicos (direção Roberto oliveira) e Prêmio Tibicuera de melhor atriz por Ópera Monstra(direção Adriane Mottola).
Prêmios são bons para reconhecimento do seu trabalho. Prêmio é bom por que te traz alguma segurança financeira... por um certo tempo.Prêmio é bom quando a “classe”,o público torce juntamente por você.
Prêmio é ruim por que te traz aquela “obrigação” de ser boa em tudo, de surpreender sempre, fama de diva (acho isso esquisito e não é meu objetivo). Prêmios são passageiros e bem vindos. Fico feliz que todos meus prêmios (os quais guardo com carinho) foram de trabalhos em momentos super difíceis de grana, estabilidade emocional e trabalhando com gente que sempre quis trabalhar. Sou agradecida. Mais agradecida por ser uma atriz jovem que pode inspirar outros atores jovens. Que desperte a garra ,entende?      
6 - O que te faz ESCAPAR tratando-se de teatro?
Fujo do fracasso. Meu medo é fracassar como atriz, mas a gente erra.Tem escolhas,de repente não tem escolhas.
Eu estou num momento que fujo de mentira. Falsas promessas de trabalho, elogios invejosos, fofocas de mau gosto, de trabalhos com nenhum retorno pessoal e financeiro, pessoas que não sabem separar o lado pessoal do profissional. De certa maneira escapo de estar em grupos. Sou uma atriz em busca do novo, de estar bebendo de várias fontes. Não gosto de me prender em grupos, mesmo tendo vontade de estar em algum da cidade (mas isso é segredo rsrs).Fujo do que pode me atrapalhar e como isso dá medo. 
7 - O que é mais difícil para uma atriz de teatro?
Deixar o teatro. Se sustentar do teatro. Aproveitar aquele momento: o palco (sem julgamentos, sem cobranças,brincar).
8 - Como foi à experiência de trabalhar com outras linguagens como a TV, por exemplo?
Eu nunca quis fazer TV. Não me acho bonita na TV e nem fora ( e beleza conta um pouco na TV,não vamos mentir).Foram experiências ótimas,conduzidas por pessoas que me deixaram livre,improvisando e sem me inibir na câmera.
Aprendi na TV como sucesso é efêmero. Tem uma foto tua Na capa da Zero hora e 1 mês depois tu volta a ser normal.É TUDO É ÊFEMERO.Aproveito o que vem.
9 - Como você enxerga a cena gaúcha atual? O que está faltando para que o teatro gaúcho tenha uma estabilidade, qualidade e notoriedade?
Vou ser bem sincera: eu não sei. Eu estou em crise, ou de mal com a cena gaúcha. Vivo um momento lindo de dois trabalhos, mas me sinto triste como muitos atores jovens. Em busca de grana, trabalho, reconhecimento, aceitação. De mal com o pouco público, a falta de espaço na mídia, as fofocas, os editais. Então está eu sozinha pensando: o que eu quero Ser PARA A CENA GAÚCHA?QUE ATRIZ QUERO SER?O QUE QUERO DEIXAR AQUI?  
10 - Você é uma atriz que transita muito entre diferentes grupos e trabalha com diferentes diretores. Fale um pouco sobre esta relação e o que tu “rouba” de cada experiência? 
Gosto de escutar. Ficar quieta, tomar meu espaço no grupo, troco com certo acanhamento. Roubo as palavras em mesas de bar, em jantas do grupo. Roubo as vontades, o espírito de união e tento me encher do mesmo amor que o grupo tem pela peça. Quando vê sou a peça junto com os atores. Cada experiência é única. Eu não saberia te dizer em palavras, talvez pudesse por em músicas e dançaria. Cada um teria uma dança e música. Seria minha homenagem a cada um que me ensinou e me fez passar pelo palco com cada presente ou desafio. 
11 - Quais profissionais gaúchos e nacionais tu destacaria? (Ator/atriz, diretores, teóricos, etc...) 
Gosto muito do trabalho de Daniel Colin, João Madureira, Jezebel de Carli, João de Ricardo (diretores que nos deixam inquietos), o trabalho das atrizes Sandra Dani, Tânia Farias, Liane Venturela)(inspirações femininas)   e a dramaturgia de Diones Camargo .Gosto de gente do teatro como Roberto Oliveira e Adriane Mottola (sábios em palavras e conhecimento)

12 - Atualmente tu estavas em cena com dois espetáculos: “Ifigênia em Áulis + Agamenon” e “A Caofusão”. Quais são teus próximos projetos?
Não tenho projetos. Não planejo e fico aberta a novos projetos. Aquela frase: o que é meu ta guardado. Quem se habilita?
13 - Gostaria de compartilhar mais alguma idéia neste espaço?   A frase: “Que seja doce” e a palavra EFEMERIDADE.





Fernanda Petit é atriz com formação na Escola de Teatro Popular da Terreira da Tribo e na Escola de Teatro de Rua da Terreira da Tribo, no Grupo Experimental de Teatro de Porto Alegre, além de diversos cursos com profissionais como: Renato Ferracini, Carlos Simioni, Luiz Henrique Palese, Nilton Filho entre outros. Vencedora dos Prêmios Brasnken 2010, e dois Tibicueras - 2010 e 2007.  


Em nome do Blog “Válvula de Escape” agradeço a tua participação e te desejo sucesso em toda a sua trajetória. Um grande abraço!
Diego Ferreira – Grupo Válvula de Escape.






Um comentário:

  1. Ufa!Cheguei aqui para ler o questionário enviado a atriz Fernanda Petit.
    Muito legal as respostas dela.
    Na sua trajetória só vi um trabalho dela e que me marcou muito com sua bela atuação.Que foi O Lorcabodas lá na Terreira,uns 5 anos atrás...
    Saiba que sempre estamos aqui no teu blog prestigiando os teus posts viu amor?!
    Beijos,
    Mamãe e Matheus

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